Todos os
anos o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), órgão máximo executivo de
trânsito do SNT (Sistema Nacional de Trânsito), escolhe um tema para a Semana
Nacional de Trânsito, que é comemorada todos os anos entre 18 e 25 de setembro
e tem por base legal o artigo 75 e 326 do CTB (Código de Trânsito Brasileiro) e
a Resolução do Contran Nº 420/69 com Anexo.
O tema escolhido para 2014, faz parte da Década de Ações
pela Segurança no Trânsito. Esta tem por objetivo reduzir em 50% o número de
acidentes com vítimas fatais entre 2011 e 2020. O tema deste ano é “Cidade para
as pessoas: Proteção e Prioridade ao Pedestre”.
Partindo do raciocínio de que o objetivo da Década é
reduzir o número de vítimas fatais em 50%, e que o título da Semana de Trânsito
enfoca as cidades como devendo ser para as pessoas, e não para os veículos, com ênfase na proteção e
prioridade do pedestre, que é o usuário mais frágil no trânsito, temos as
seguintes questões: É Teresina uma cidade para as pessoas? O pedestre, em todas
as suas formas e utilizações, possui preferência e prioridade no que diz
respeito a segurança no trânsito?
Segundo dados do Denatran, até junho deste ano, Teresina
possui uma frota total de 394.592 veículos e, de acordo com o IBGE, uma
população estimada para 2014 de 840.600 pessoas. Levando em consideração a
frota total e a população estimada, temos 47% de veículos sobre a população, ou
seja, quase a metade da população possui algum tipo de veículo na cidade. Se
dividirmos esses valores, teremos 0,5 veículos para cada pessoa, isto é, para
cada veículo, duas pessoas. Cerca de 86% da frota total na cidade é formada por
veículos de passeio e de duas rodas, sendo respectivamente 45% e 41%. Teresina
possui uma área territorial de 1.392 Km2 com 585 habitantes para cada
Km2. Isto representa 0,07% da população.
Os dados
apresentados, fazem de Teresina a capital do nordeste com: (1) maior
concentração de veículos sobre a população; (2) menor quantidade de pessoas por
veículo; (3) maior área territorial por Km2 e; (4) menor quantidade
de habitantes por Km2. Em todo o estado, somente 223 municípios registram
frota veicular , e o total chega a 900.335 veículos. O percentual de veículos
sobre a população do Estado é de 28%, com estimativa de 3.194.718 pessoas para
2014. Cerca de 88% da frota total do estado é formada por veículos de passeio e
de duas rodas, sendo respectivamente 31% e 57%.
A frota total do Estado equiparasse em percentual com
a de Maceió-AL, a capital do nordeste com menor concentração de veículos sobre
a população, e uma das maiores quantidades de pessoas por veículo. Embora tenha
uma população estimada de 1.005.319 pessoas, 16,4% maior que a de Teresina,
Maceió possui apenas 27% de veículos sobre a população, uma diferença de 20% em
comparação com a de Teresina e cerca de 3 pessoas para cada veículo. Embora com
uma população maior, Maceió possui área territorial de 503 Km2 e uma
concentração de 1.854 pessoas por Km2 ou 0,18% da polução, números quase
três vezes menores que os de Teresina.
Porém, ao compararmos Teresina com as demais capitais,
observamos que independentemente da área territorial ou a quantidade de pessoas
por Km2, a frota veicular de cada cidade parece estar relacionada a
outro indicador. A título de análise temos Natal-RN com a menor área
territorial, de apenas 167 Km2, e maior concentração de pessoas por
Km2, 4.805 pessoas ou 0,56% da
polução. Com população estimada de 862.044
pessoas e frota veicular de 347.158 veículos, dados parecidos com os de
Teresina, Natal fica em 2º lugar no ranking de capitais do nordeste com 40% de
veículos sobre a população, e 2,5 pessoas para cada veículo. O que justificaria
a capital com área territorial 8 vezes menor que Teresina e concentração de
pessoas 8 vezes maior, possuir um percentual tão exorbitante de veículos por
população? O que faz com que Teresina possua quase a metade de sua população em
veículos? A resposta está no constante aumento do uso de transporte individual,
principalmente de motocicletas.
As cidades estão sendo projetadas, planejadas e
adaptadas para os veículos, que ocupam cada vez mais espaço e prioridade nas
vias. O desejo de depender menos do transporte público é uma realidade tanto dos
usuários de Teresina quanto os de outras cidades. Das capitais consideradas
anteriormente Teresina é a que possui maior frota percentual de veículos de
duas rodas, com 41% da frota total em comparação com 24% em Natal e 21% em
Maceió. Outro problema tem haver com o mercado e economia, que dá condições de
possuir o veículo de forma mais fácil e rápida que a de tirar a 1ª habilitação –
o que além de superpopulação de veículos gera perigos no trânsito. Isso pode
ser observado pela quantidade de veículos registrados em relação a quantidade
de condutores habilitados. Em janeiro de 2013 o número de habilitados no Piauí
era de 386.774 pessoas, cerca de 51% de habilitados sobre a frota total de
veículos daquele período. Dados assim justificam o elevado percentual de cerca
de 19% das entradas no HUT serem relacionados a acidentes de trânsito e destes,
cerca de 80% serem com veículos de duas rodas.
A tendência de crescimento dos veículos nas cidades
tem induzido principalmente os pedestres a procurar o transporte individual. Talvez
porque seja mais fácil cobrar espaços para estacionamentos, que calçadas. Ou
quem sabe por ser mais fácil circular com um veículo adaptado do que com a cadeira
de rodas, bengala ou muletas. É mais fácil ter preferência ou cobrar respeito,
quando se anda com o modelo de veículo do ano ou passar por espaços estreitos quando
o veículo permite isso, mesmo que de maneira errada.
A solução poderia ser o que a muito se prega: aumentar
e intensificar a fiscalização. Mas deveria ser apenas um dos recursos usados
para solução. Sem um transporte público de qualidade a população se obriga a
procurar como alternativa um meio de transporte independente. Isso faz com que
os investimentos em infra-estrutura e urbanismo, fiquem concentrados em tornar
a cidade cada vez mais apta para o veículo. Como resultado final, as calçadas e
passeios, bem como outros espaços para o pedestre ficam, se não sacrificados,
sufocados pelos veículos.
Portanto, para Teresina ser uma cidade para as
pessoas, as leis, a engenharia, a fiscalização e os trabalhos de educação devem
ser voltadas para as pessoas e não apenas para condutores e veículos. Que por
seu crescimento desordenado tem sacrificado o humano para dar espaço à máquina.